ENTRETANTO é um clube de relacionamento que usa a fotografia como forma de aproximação pessoal. Cri

sábado, 19 de maio de 2012

De Fotografia e Tristeza


Por Ane Molina

Relendo coisas e fichando livros que, antes, só tinha lido por esporte. Engraçado como as coisas batem de forma diferente, depois de um tempo. E é, certamente, a gente que muda. Pensar teoricamente a fotografia pode parecer estranho. Me pareceu. Pensar e teorizar algo que é tão prático e que, em um primeiro momento, prá mim, parecia tão técnico. Fotografia é algo altamente técnico. O início do aprendizado é assim. A gente só consegue pensar se a fotometria está correta, se estamos conseguindo fazer foco, se o enquadramento está ok. E, mesmo o tal “enquadramento” é um conceito meio confuso no começo.

Depois de um tempo, começamos a nos soltar desse nervosismo todo que nos causa o “Click”. Esse bandido que no fundo, no fundo, se traduz como “menos uma foto”. Não importa se é analógica ou digital, pois sua câmera digital também tem uma vida útil que parece eterna, mas não é. Cada click é menos uma foto, assim como cada amanhecer é menos um dia, cada aniversário é menos um ano. Isso tudo numa visão bem pessimista da coisa, por vezes, necessária.

Quando dominamos, mesmo que minimamente, o controle da luz e o momento exato de apertar o botão, temos tempo mental (e “tempo mental” é um conceito novo a precioso prá mim nos últimos meses) para tentar ultrapassar certos limites que antes sequer concebíamos. Eis a hora de pensar fotografia.

Uma primeira etapa desse pensar é, justamente o não fotografar. É o ver. Ver muitas fotos. Sempre digo aos alunos que é importante ver. O Bizerra (grande professor) pede que os alunos tentem ter um “olhar mais fotográfico” sobre do mundo. Enfim. Alimentar-se de imagens. Reli essa semana o Câmara Clara e ele parece bobo e até ingênuo em determinados momentos, mas fala muito sobre o que nos atinge em uma fotografia, o que nos toca nela. O que faz uma determinada foto “existir” para cada um de nós. Vale o pensamento. Começamos a pensar o que faz a fotografia e, pouco modestamente, tentamos decifrar o que faz dos grandes mestres, grandes mestres.

Mas depois de ler algumas coisas, pensei a fotografia com tristeza.  Algo que já aconteceu. Algo que não está mais. Que não é mais. Um dia foi, mas já não é. Não exatamente da mesma forma. Tenho a mania extravagante dos murais de fotos. Gosto dos gigantes. Verdadeiros mosaicos que me remetem a tempos, lugares e pessoas. Gosto de acordar, fazer o meu café, e dar bom dia a todos aqueles seres amados e, por vezes, distantes que estão comigo ali, sorrindo prá mim na parede da minha cozinha. Gosto das colagens, dos retalhos. Não sou muito ortogonal. Nem no modo de compor, nem na vida, nem nos sentimentos. Em nada, na verdade. Curto demais a bagunça. Meus murais de fotos são o reflexo do meu coração.

Parada na frente do meu mural hoje, sorri para algumas fotos, para algumas pessoas. E pensei o quanto aqueles momentos não seriam mais. Mesmo pensando em tudo com alegria, afinal de contas foram momentos meus, que eu vivi, a foto mostra que eu estava lá, mesmo assim, minha alegria era triste. Meu sorriso era de perda. Em dimensões pessoais isso me atinge. Atinge também minha alma fotográfica. A fotógrafa que existe em mim.

Hoje, uma foto em especial me fez chorar. E não tinha feito antes. É uma foto que considero especial, pelo momento. Mas não considero uma das minhas melhores. Hoje essa foto me trouxe algo de melancolia. Um “tranco” que me chocou, tamanha a violência com que meus sentimentos me atingiram. Pensar na foto como algo que já se foi, algo que passou. A foto é A Menina Escrevendo na Mão.

A Menina Escrevendo na Mão - Paris 2012

O povo da teoria vai dizer que é isso mesmo. Fotografia é perda, é morte. É memória de algo que acabou, ou que em breve acabará. Mas, de certa forma, teorizar é distanciar-se. Fotografar, pelo menos da forma que eu acho que deve ser, é aproximar-se. Um amigo me disse ontem que os teóricos acabam se distanciando do “click”. Espero que não aconteça comigo, porque só quem fotografa pode ser atingido com tal profundidade por aquilo que fotografa. Ter feito a foto dessa menina tão de perto, em um momento tão distraído e ingênuo me torna parte da história dela. Tê-la encarado segundos após o click e ter visto em seu rosto o medo e o susto por ter sido surpreendida em um momento tão seu me torna personagem da sua vida. Saber algo se partiu naquele momento e que aquela menina nunca mais escreveria distraidamente na própria mão sem observar se não estaria por ali algum fotógrafo à espreita. Saber de tudo isso me causou, ao olhar novamente aquela foto, uma sensação de “nunca mais” tão profunda e tão aguda! Ninguém, a não ser eu, saberia como eram os olhos daquela menina no momento exato. Ninguém jamais saberia depois daquilo.  

Esse “encanto desrespeitoso” que temos pelo que fotografamos e que nos faz parte de suas histórias é que nos faz também roubar um pouco deles. Se o eternizar parece lisonjeiro, também é triste. Empresta ao objeto da fotografia essa eternidade irreal que, na verdade, só reafirma a efemeridade dos momentos, o quanto estava lá e já não está mais.

terça-feira, 8 de maio de 2012

Que feio! por Mariana Barros

Ai meu Deus! Como escrever sobre esse tema sem parecer uma chata?! mas vamos lá... Algumas experiências vividas, na minha percepção, significam mesmo um caminho sem volta. A partir do momento que aprendemos a saborear peixe cru, degustamos um vinho frutado com taninos densos, deixamos a música inundar nossa alma, vivenciamos a consciência plena... entramos em contato com a boa fotografia... tsc, tsc, tsc ...já era!!! nunca mais voltamos a ser os mesmos. Os sentidos se alinham de tal maneira, que começam a filtrar só o que é belo, é gostoso, é agradável, é interessante...

Aprendi por mim mesma que minha forma de sentir o mundo não é melhor do que nenhuma outra, apenas diferente. Hoje, consegui a difícil tarefa de ser uma observadora de mim mesma. Saí da caixa e olhei de cima, a Mariana sentada, muletas ao lado, tornozelo roxo, inchado, devidamente imobilizado, atestados infindáveis e uma vontade incontrolável de aprimorar a visão fotográfica.

Depois de tantos encontros no Entretanto, depois de tanto participar dos cursos desse projeto, era impossível passar desatenta ao processo de construção e desenvolvimento do olhar fotográfico. Por isso, sempre que posso, observo incessantemente fotos e mais fotos. Aprendi a distinguir a fotografia arte da fotografia comercial.

Uma amiga querida que vai casar me disse que tava pensando em contratar um fotógrafo cujo orçamento era bem menor que a média do mercado. Curiosa que sou, fui dar um olhadinha. Todas, atenção: t o d a s as fotos estavam estouradas com luzes tão intensas que pareciam filmes de ficção científica. Pense num por do sol, quase noite mesmo, a noiva sentada no deck, tudo escuro, com aquela luz de disco voador aterrissando na terra?! Aff!!!!! eu poderia ficar citando aqui um milhão de detalhes que chamaram minha atenção, mas chega! Que feio! Muito feio eu ficar julgando isso ou aquilo. Muitas vezes quem contrata um fotógrafo não quer registrar um momento, mas um sonho. E outra: há mulheres que sonham em ser comparadas com modelos de peles perfeitas, estar sob a luz de holofotes, mesmo que isso signifique aparecer na foto completamente diferente do que vê diante do espelho, e digo mais... pouco se importanto com o que é cult, é style, é vintage, é de bom gosto... blá, blá, blá .

Termino esse texto em tom de auto-crítica. Ainda que o caminho seja sem volta, é o meu caminho, com minhas interpretações, minhas sensações e o meu olhar. A observação me fez perceber que eu tava querendo fazer uma padronização idiota, sem respeitar a foto alheia, que de qualquer forma, encantou e fez alguém feliz. E viva a diversidade de gostos, a propagação do conhecimento e a imensa amplitude do olhar... viva o Entretanto.

terça-feira, 1 de maio de 2012





por Ane M. Molina

Do alimento, da fotografia, do instinto

Fui prá cozinha nos últimos tempos. Sempre gostei de cozinhar e, depois que me separei, me falta público. Me falta companhia, me falta tempo. Mas tem épocas que dou conta. E me faz feliz. Essa coisa toda dos gêneros, prá mim, sempre foi muito clara. Dentro do que acredito e pratico como filosofia de vida, cada qual tem seu papel. Eu acho sim, que a mulher veio ao mundo para alimentar. Para ser mãe. Muitas vezes sem parir a cria. Mas a gente veio para cuidar. Tenho um amigo que diz q sou tooooooda isso. Cuidado. Já o terapeuta, como já comentei outro dia, me acusou de controladora. O pior tipo de controladora e manipuladora. Aquela que manipula e controla através do amor.

Sim, sim, sim! Alimento. Dou de comer. Minha mesa repleta de gente é a minha alegria. Coisa da minha vó. Ir a casa da minha vó e não comer é ofensa. Na minha também. Adoro aquela carinha fofa que me olha e pergunta “tem mais?” Pode ser que tudo seja um feitiço, muito bem feito, prá amarrar as pessoas na minha vida assim. Cozinhando. Vai saber!

Me chamaram prá fazer parte de um projeto que tem a ver com gastronomia. Maravilha! Fotografia e comida. Hmmm… A fotografia e a cozinha se completam. Fotografia Gastronômica é um luxo. Fascina. A cozinha, por si só, já é um ambiente fotogênico. Agora coloque pessoas lá dentro, cozinhando… afemaria!

Carinho, afeto, chamego. Aromas, texturas, sabores. Olhar, desejar, apropriar-se … tudo isso lembra… sexo. Também inevitável! Comida tem a ver com sexo. Fotografia tem a ver com sexo. Uma pessoa no domínio de sua cozinha, nada mais sexy. Uma pessoa olhando prá você, profundamente,  com uma câmera na mão. Idem. Por mais profissionais que nós nos portemos (e no meio da fotografia isso é mais que necessário) a figura do fotógrafo vai sempre carregar essa dose de erotismo. Sempre. E quem vai pra cozinha lidar com todos esses ingredientes, maravilhas sensoriais em pleno processo de transformação, também.

Agora, tente ver tudo isso sem nenhuma sacanagem. Sei, é difícil, mas tente. Somos motivados por coisas, certo? Geralmente por instinto. Na verdade, sendo e nos achando, muito civilizados, tentamos dominar esses instintos o tempo todo. Mas, sendo bem sincera, acho que as melhores coisas que fazemos são aquelas que fazemos instintivamente. Sabedorias milenares orientais afirmam que nossa energia, em essência, é sexual. É essa energia, criadora e pura, que é a gênese de todas as outras forças que nos movem. Faz parte do nosso instinto de sobrevivência. Assim como comer, como alimentar…

Acho que a fotografia tem um pouco disso também. Desse instinto. Dessa coisa instintiva do olhar, do entender, do “propriar-se”, de certa forma, daquilo que se fotografa ou de quem se fotografa. Tem gente que TEM que olhar. Eu sou assim, se me chama a atenção eu olho mesmo. “Gente interessante, se não quer ser olhada, que fique em casa.” Ouvi esses dias. E é mesmo. E isso não tem nada de sexual, na prática. Ninguém vai sair atacando o povo por aí! Mas a gente olha. Sendo fotógrafo, a gente olha mais.

Tudo isso prá falar desse instinto. Dessas coisas que a gente tira, não sei de onde, e que acabam se transformando no nosso trabalho. Essas inspirações. Esses momentos, esses sabores, essa vida que vivemos e que transforma tudo o que tocamos. Sempre acho que poderia estar vivendo mais intensamente tudo e que não estou. Realmente, sorvendo a vida com vontade. Sempre acho que devemos ir além. Essa necessidade vem de mim, passa por mim e acaba na minha fotografia. Essa necessidade de provar, de me aproximar. De “ter” com o que fotografo (como dizem tão bem os portugueses e de quem adotei essa expressão tão elucidativa) “Ter” com quem fotografo. Ter quem fotografo. Pertencimento, vontade, prazer. Tudo em um só momento.

Fotografe, cozinhe e ame. Com vontade!

4º Curso de Fotografia Entretanto




"O bom fotógrafo deve buscar  o extraordinário escondido nas mangas da simplicidade." Foi com essa proposta que o fotógrafo Plínio Ricardo ministrou o  4º Curso de Fotografia  ENTRETANTO.  O cronograma que é voltado para o desenvolvimento do olhar fotográfico e sensibilidade artística, usa restaurantes e cafés como cenário para as aulas teóricas e as ruas e becos geométricos de Brasília para as aulas práticas.  Um momento de diversão e envolvimento com novas idéias.